09 julho 2006
Anjo da Guarda
C. acotovelou-se o melhor que pode no teleférico, ao sinal de partida dado pelo homem de azul com ar seguro. Agora um solavanco atirou-os para o imenso nada sobre o mar, entre um zumbido de motor e o vento infiltrado nas janelas semi-fechadas. O silêncio de todos, o sol que tardava em recolher, o remorso em C. Pela palavra que não fora dita ao entrar no elevador, pela dificuldade em ver para além daquela alma revestida a drama, quase ansiosa por tragédia.
Perdeu o sentido do tempo à medida que a viagem avançava, sentia que os sentidos opostos se diluiam e que o cabelo de P. se misturava com o sonho, que ela estava ali na queda imensa.
Antes de o tempo se partir na infinitésima medida, mesmo no momento em que o corpo antecipava o fim dos sentidos, percebeu a fronteira ténue das garras da morte do sentimento, e desejou não perder mais o anjo que o guardava.
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